Contos de bruxa


SINOPSE

A bruxinha Bibica fazia maçãs do amor para seus bichinhos amigos ao receber a visita de uma desagradável fada, que ainda não aprendera que o preconceito é um grande problema na vida de todo mundo.
Acompanhe essa história e descubra que a bondade está dentro de qualquer pessoa.



CONTOS DE BRUXA
Texto e ilustrações de Marcos Cárfora

           
                 Para Barbara, a personagem principal
das minhas histórias.

 I 

 No alto de uma montanha, depois de uma floresta que ninguém sabe onde fica, existe um castelo, que pouca gente se atreve a visitar. Primeiro, porque ninguém sabe onde fica. E depois, as más línguas dizem que é um castelo tremendamente assustador.
                
Naquele castelo mora uma pequena bruxa. Seu nome é Bibica. Bibica já nasceu bruxa. Sua avó era bruxa, sua mãe era bruxa, e ela seguiu as tradições da família.

Bem, nem todas as tradições ela seguiu...

     Contam as lendas que as bruxas sempre fizeram maldades. Uma maçã envenenada aqui, umas crianças no caldeirão ali, aquelas histórias que todo mundo conhece.

     Mas Bibica era diferente. Uma vergonha para as tradições das bruxas. Teimava em ser boazinha. Outro dia, imagine você, ela fez uma magia e curou a asa de um morcego vesgo que, em um de seus voos, acabou atropelando uma árvore. Mais do que isso, ela tirou do seu caldeirão um par de óculos e resolveu o problema de visão do pobre morceguinho, que hoje voa contente pela floresta.

     Bibica vive feliz em seu castelo, na companhia dos seus amigos morcegos, ratos e aranhas. Para ela ser plenamente feliz, só lhe faltavam amigos para brincar. Como seria bom ter alguém com quem conversar, trocar receitas, contar segredos... mas quem gostaria de ter amizade com uma bruxa, que morava em um castelo no alto da montanha? O jeito era aprender “morceguês” e tentar estabelecer uma conversa com os morcegos, mesmo...





II

     Numa montanha ainda mais alta do que aquela onde mora a bruxinha Bibica, depois da floresta encantada, bem pertinho das nuvens do céu, existe um castelo muito bonito onde vivem as fadas. Elas cantam o tempo todo e se preocupam em fazer o bem ou desfazer o mal que algumas bruxas fazem.

     Neste castelo mora uma menina, aprendiz de fada. Seu nome é Léia. Léia já nasceu para ser fada. É um encanto de menina, com lindos cabelos louros e olhos azuis bem grandes. Modelo exemplar de uma fada.

     Bem, não tão exemplar assim...


     Léia vive fazendo maldades e brincadeiras de mau gosto. Depois, tenta colocar a culpa em outras fadinhas: “Não foi minha culpa, mamãe! A culpa foi da fada Maria!”. Sua mãe a repreendia, dizendo-lhe: “Dessa maneira, você nunca vai conseguir sua varinha de condão, minha filha...”. Vira e mexe, Léia amarrava as asas das fadas mais desatentas que, ao tentar levantar voo, levavam um tombo.

     No castelo das fadas, as fadinhas mais novas passam anos em treinamento, como numa sala de aula, aprendendo a manejar as varinhas de condão. Durante este período, elas utilizam varinhas falsas que não fazem mágica, apenas para aprender como utilizá-las. Para ganhar uma varinha verdadeira, elas precisam completar dez anos de idade e ter pelo menos três anos de treinamento.

     Todas as fadas têm um computador de cristal conectado à Encantanet, um tipo de Internet do mundo encantado que serve para elas observarem se existe alguém precisando de ajuda. O sonho de toda fada é ajudar uma bela moça a conquistar um príncipe encantado ou derrotar uma bruxa. Certo dia, xereteando em um desses computadores, Léia acabou sintonizando a bruxa Bibica, que fazia uma torta de maçã enquanto vários morcegos e ratos esperavam ansiosamente por um pedaço.
     
     “Aquela torta deve estar envenenada...” – pensou Léia.


III

     Algumas semanas se passaram e chegou o aniversário de Léia. Ela era pura ansiedade, completara dez anos e já havia acabado seu treinamento – estava pronta para receber sua varinha de condão. Para isso, ela precisava passar no último teste: praticar algum bem ou desfazer algum mal.

     Quando a festa de aniversário acabou, Léia correu para ver se achava alguma coisa errada acontecendo e assim, tentar consertar. 

     Mas o desejo maior de Léia era achar alguma bruxa fazendo maldades! O que ela queria mesmo era pôr alguma bruxa para correr! “Isso sim seria um grande feito!” – pensava – “Com isso, certamente irei conseguir minha varinha de condão!”.

     A pequena fada então conectou seu computador de cristal à Encantanet e passou a procurar por bruxas. Para sua tristeza, descobriu que, exatamente neste dia, as bruxas adultas estavam em uma conferência especial para preparar a festa de Halloween.

     Ela então se lembrou daquilo que havia visto uns dias antes em seu computador... aquela bruxinha fazendo uma torta de maçã! “Maçãs e bruxas sempre foram a combinação exata de alguma maldade!” – pensou Léia – “Vou voando àquele castelo horroroso onde mora a tal bruxinha feiosa e mal vestida, para salvar aqueles pobres bichinhos!” .

     E lá se foi a Léia correndo... ou melhor, voando.







IV

     A bruxa Bibica estava fazendo maçãs do amor. Gostava muito de cozinhar, esta bruxinha. E gostava especialmente de maçãs. Nisso, ela seguiu as tradições das bruxas. Os morcegos ainda esperavam ansiosamente para provar um pedaço daquelas robustas maçãs.
     
Foi quando Léia entrou voando pela janela do castelo da bruxinha Bibica, gritando em alto e bom som:

     - Muito bem, sua bruxa! Já basta de maldades! Não vou deixar você envenenar estes bichinhos!

     A bruxinha Bibica ficou tão assustada com aquilo que até perdeu a fala.

     - Vamos, sua bruxa! Me entregue a fórmula deste seu veneno para que você nunca mais possa envenenar ninguém! Assim, eu me tornarei uma verdadeira fada, pois ganharei minha varinha de condão!

     - Ora essa! – zangou-se Bibica – Como se atreve a entrar em minha casa e me acusar desse jeito?
     
     - Casa? Há! Há! Há! – debochou Léia – Isso é um castelo horroroso! Nunca em minha vida vi tão pobre moradia!

     A bruxinha Bibica ficou tão magoada com o que Leia falara, que começou a chorar, sentida. Léia então pegou todas as maçãs do amor que Bibica havia feito. Os morcegos ficaram bastante desapontados...

     A Léia levou as maçãs supostamente envenenadas para o castelo das fadas.

     - Aqui estão as provas, mamãe, de que eu fiz o bem e...

     Mas as fadas nem deixaram que Léia terminasse de falar.

     - Uau! Maçãs do amor!
    
     Tomaram-lhe as maçãs todas e começaram a saboreá-las, com grandes mordidas.

     - Não comam! Estão envenenadas! – gritou Léia – Eu tomei estas maçãs de uma bruxa que mora naquele castelo lá embaixo.

     - Sim, nós vimos pela Encantanet. – disse uma das fadas conselheiras.

     - Que papelão, minha filha! – retrucou a mãe de Léia – Você fez tudo errado! Magoou uma pessoa boa, acusando-a de fazer o mal sem ter provas. Tudo por causa de sua aparência e do lugar onde mora! Estou decepcionada! Por causa disso, eu darei à bruxinha Bibica a varinha de condão que era para ser sua!

     - Mas, mamãe...

     - Não tem mas nem meio mas! Você foi uma fada preconceituosa e arrogante. A bondade das pessoas está nas ações que elas fazem, e a bruxa Bibica é uma pessoa boa.

     
As fadas desceram das nuvens e foram até o castelo da bruxinha. Chegando lá, Léia se desculpou com Bibica.

     Então, a mãe de Léia deu a varinha de condão à jovem bruxa e disse:

     - Agora você pode ser uma fada!

     - Não, muito obrigada. – respondeu Bibica – Eu não preciso ser uma fada.  Posso continuar sendo o que sou, uma bruxa boa. Uma pena que as pessoas não entendam, por isso não tenho muitos amigos. Só os morcegos gostam de mim...

     - Aí é que você se engana! – Disse Léia.

V


     No alto de uma montanha, depois de uma floresta que ninguém sabe onde fica, existe um castelo, que todo mundo gostaria de visitar. 
     
     É o castelo da bruxinha Bibica, onde um monte de fadas e bruxas estão cantarolando e dançando, em uma festa que muita gente gostaria de ir...
    Mas ninguém sabe onde é.



Texto registrado na Fundação Biblioteca Nacional

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